domingo, 10 de agosto de 2008

"O ego em desabafo: diálogo com o outro"

Oi! Como você está?
Sábado, estive num Psicodrama e o tema "O Outro", esteve "super" em pauta na minha cabeça, fiquei com muita vontade de compartilhar com você.
Tudo começou assim: a diretora perguntou ao grupo, que frase vinha à mente quando pensávamos nas nossas experiências pessoais ao longo das vivências em psicodrama.
Imediatamente brotou em mim a frase: "O outro, as cenas, espelhos de mim."
Um grupo de pessoas, se sensibilizou com o tema e criamos um "roteiro espontâneo". Quando a "coisa" foi acontecendo, acabamos falando do homem e de sua sombra: "o ego".
Montei o texto à seguir, na tentativa de reproduzir todas as descobertas e observações interpretadas cenicamente pelo grupo, durante as atividades. Olha só que interessante:


"O ego, em desabafo: diálogo com o outro!”

- Disse o "Ego", muito aflito, para o "Outro":

-"Você é a parte de mim que me embaraça, me incomoda, me perturba e me enfurece.
Por isso, prefiro ver em você, as detestáveis características minhas que luto em ocultar, afinal, preciso me defender! Como ousa me desafiar?
Você me confunde, me inunda com seus julgamentos; e suas críticas colocam minhas frágeis certezas no chão.
Vivo em busca da sua aprovação, do seu reconhecimento, do seu apoio e basta um olhar seu, para que me tomem todas as incertezas.
Por essa razão,brigo com você, odeio seu modo de ser,e me pergunto por que você não é do jeito que eu quero?
Por que você não faz as mesmas escolhas, não prioriza as mesmas coisas e não adivinha as minhas necessidades?
Me faço de vítima, quando quero o seu consolo e o seu apoio. Ofereço minha submissão em troca das coisas que quero de você. Mas nós dois sabemos, que a submissão é apenas a máscara da minha manipulação.
Obviamente que ao lhe oferecer minha submissão, me certifico da melhor maneira de agradar seu frágil ego, e descubro também, como lhe culpar pelo poder que concedi.
Outras vezes, sou eu quem lhe domino e aceito a ilusória tarefa de satisfazer seus desejos. Em troca, você aceita as minhas regras para o jogo e minha incontestável e eterna razão. Você precisa definitivamente aprender, que eu estou sempre certo!

Nossa dor existencial e a distância entre nós, persiste, afinal, estamos sempre jogando: "Não posso mostrar quem de verdade sou, enquanto você não estiver completamente vulnerável à mim. Da mesma maneira, não quero que você me mostre seus defeitos, porque quero continuar vendo você realizando minhas idealizações, e vou detestar quando você não se encaixar em todos os papéis que espero que assuma em minha vida. Saiba que não assumir aquilo que espero de você, é a fórmula certa para que eu o rejeite ."
Eu também assumo vários "papéis" para te agradar, nós sabemos disso!
Coloco sobre as minhas costas milhões de responsabilidades em relação as suas expectativas , mato meus ideais, meus desejos, meu bem-estar, porque ocultamente uma força, me faz temer e evitar a todo custo o título de “mau” e de "errado".
Não posso ser mau pra você, não importa o quanto eu tenha que me retalhar para manter a ensaiada bondade que em mim está condicionada. É evidente que você pagará o preço por isso. Lutarei para provar que você é quem é mau, torto e errado, e não eu!
Nem que pra isso eu precise jogar na sua cara todas aquelas coisas que o fragilizam, e que você decidiu me contar num momento de carência. Você sabe muito bem, que sei "cutucar a sua ferida". A gente aprende isso bem cedo na vida!
Tenho tanto medo de crescer e de perceber minhas "humanas fragilidades". Por isso, tento corrigir você, eu preciso torná-lo perfeito! Acredite, sei o que é melhor pra você! Sei como você deve resolver seus problemas, mas não sei como resolver os meus; porque os meus, são mais complexos e dolorosos que os seus.
Aliás, quero que saiba que minha dor, dói mais, muito mais! Por essa razão, você precisa me ouvir e me apoiar, incansavelmente, pra que eu não comece a ter motivos para duvidar dos seus sentimentos por mim. Como você que me ama, pode estar indisponível ou ausente, quando eu preciso? Os seus interesses pessoais não podem ter valor quando eu estiver sofrendo!

O que mais me incomoda é que quando olho pra mim, sinto medo; um medo profundo e indescritível.
Me vejo pequeno, frágil, incapaz; mas preciso esconder a todo custo, isso de você, afinal, tenho que fingir meus sentimentos; porque isso me coloca em segurança!
Já que tenho medo de você,da vida e de tudo que não posso controlar, reúno todas as forças que encontro em mim e na primeira oportunidade mostro pra você o quanto sou poderoso, perigoso, melhor e mais competente que você em todos os sentidos.Tenho certeza de que dessa forma você não poderá me machucar...
É estranho, mas todas essas artimanhas não resolvem, porque ou você luta comigo numa guerra sem fim, ou você se afasta e me deixa de novo sozinho.

Solidão, detesto essa palavra, ela é ameaçadora!

Descobri que apesar de todo o mal que você me faz, preciso da sua presença na minha vida, para que eu possa sentir algum prazer e encontrar algum sentido para tudo isso.
Confesso que às vezes me canso do trabalho que me dá manter você na minha vida, e num grito de socorro e de liberdade, começo a trocar a necessidade da sua presença por objetos..,.coisas, que compro e compro, pessoas que me trazem um prazer momentâneo e descompromissado, e por um breve instante pareço sentir algum prazer.
Mas isso não dura, meu vazio persiste, e a culpa é sua, afinal, por que você não fica do meu lado, do jeito que eu quero?

Disse o ego:

"Outro dia eu tive um sonho, muito estranho por sinal!

Sonhei que tudo que me incomoda em você, espelhava características minhas. Era tão estranho!
Eu me via através de você, assim como você se via através de mim . Senti que me amava através de você, vi meus pais através de você, foi tudo confuso demais...
Tirei uma armadura e vi que você fazia o mesmo. Ficamos ali, tão humanos, tão naturais, olhando um nos olhos do outro. Tocamos nossas faces, nos abraçamos em silêncio e uma ternura imensa cresceu entre nossos corpos.
Notei que nos aceitávamos e nos recebíamos sem expectativas. Brincávamos, conversávamos e uma alegria inocente tomava conta de tudo.
Não havia angustia, nem medo, você acredita? Tudo parecia ganhar uma estranha dimensão. Parecia até, que as dores dentro do meu peito haviam desaparecido...
Lembro que não nos importávamos em estar certos ou errados. Esquecemos do tempo e das nossas responsabilidades e apenas estivemos ali, juntos, pela primeira vez.
Você acredita que parecia não haver nenhuma distância entre nós? É como se não estivéssemos mais separados!
Não tive medo de exibir minhas fragilidades e você as recebeu com tanto respeito e compreensão, me dizendo que somos iguais e que os medos que nos separam são ilusórios.
Pela primeira vez eu não temi você e nem a mim.

Fiquei muito confuso ao acordar!

Será possível que um dia eu consiga vê-lo como alguém semelhante a mim?
Será que um dia eu poderei mostrar quem sou e ser aceito por você e por mim, assim, sem dor, sem castigo, sem luta, sem cobranças?

Como não sei a resposta, comecei a procurar algo para me concentrar, preciso de algum problema para me ocupar. Preciso pensar nos perigos da vida, para evitá-los. Preciso encontrar defeitos em você, e me ocupar com eles, assim, eu me distraio da dor dos meus próprios abismos."

Engraçado, né? Dá pra refletir sobre muitas coisas, especialmente sobre a maneira como nos relacionamos com as pessoas.
Meu desejo é que haja um tempo e um espaço, para que todos nós possamos avançar além dos nossos limites e que finalmente percebamos que a vida é repleta de alegria e de oportunidades, afinal, somos muito mais do que um frágil “ego”.
Nesse tempo, “o outro” será uma extensão harmoniosa de mim, um fragmento perfeito do Todo, assim como eu.

Uma linda semana pra você e muito Amor em suas relações!

Adely

*Dica: Todos os sábados, psicodrama no Centro Cultural SP ( r. Vergueiro) à partir das 10:30. Evento gratuito!

Um comentário:

Fernanda Cintra disse...

Sabe, que este texto caiu em um momento em que estou vivendo isto num relacionamento.
Parece que estamos sempre na busca de problemas e defeitos no outro, e esquecemos de simplismente viver e estar junto, sem expectativas.
Esquecemos de viver os bons momentos, e só viver, sem buscar que o outro me preencha daquilo que nem eu mesmo me dou.
Adorei o texto e vejo como fazem falta atualmente as sessões do psicodrama.
Você explorou de maneira perfeita o assunto ego.
Pq será que depois de tanto estudo, vivências e experiências, ainda insistimos em ser um f´ragil ego e sermos "escravos" das nossas próprias prisões e medos?
Pq simplismente não vivemos o hj o momento o presente, as pequenas alegrias, sem esperar nada do outro,sem cobranças, sem a manipulação do ego?
É realmente algo a se pensar...e a única certeza que eu tenho a cada dia que passa, é que nada sei!!
Que aprendo mais a cada dia, e que muitas vezes deixamos de viver moementos prazeirosos com o outro, e ficamos brigando com nosso ego através da outra pessoa.
Obrigada Bruxa por fazer cair mais uma ficha!!!
Fernanda Cintra